quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Desabafo de um educador

Não sou professor, mas já fui.


Trabalhei com muita gente ligada à Educação e fiz muitos amigos entre essas pessoas.

Sei o quanto é difícil ser educador no nosso país.


O conteúdo a seguir é a transcrição quase integral de um e-mail (uma apresentação em Power Point narrada por um professor) que circula pela Internet há alguns meses e que não reflete totalmente minha opinião, embora reflita a de muitos.


A minha opinião é que a culpa não é do governo, mas da sociedade que não educa mais os seus filhos e transfere essa responsabilidade para a escola. E a solução desse problema não se dará a curto prazo, porque a estrutura e o papel da instituição chamada família precisa ser urgentemente repensada!


Omiti os nomes de algumas entidades para não ser tendencioso nem criticá-las diretamente.


Fica aí a informação para a reflexão de cada um:


"Outro dia, folheando uma revista num consultório médico, li uma reportagem bastante interessante que mostrava, com estatísticas, que as crianças de origem asiática que vivem no Brasil apresentam um desempenho escolar superior ao dos estudantes brasileiros.


O texto explicava que, nas classes onde elas são maioria, o silêncio e a atenção são uma constante. Ouve-se claramente a voz do professor explicando a matéria.


Dizia também que essas crianças dedicam nove horas diárias ao estudo (cinco na escola e quatro em casa) enquanto que as nossas (as brasileiras), apenas cinco (as da escola).


Quando chegam em casa, essas crianças - as de origem asiática - pegam seus cadernos, livros e estudam.

Fazem os deveres de casa que o professor passa, lêem, treinam equações matemáticas, etc.

Enquanto os brasileirinhos, em sua maioria, vagueiam pelas ruas empinando pipa ou jogando bola.


Com isso, os asiáticos do nosso país estão conseguindo os melhores postos de trabalho (que são justamente aqueles que exigem maior qualificação e preparo) em empresas com ótima remuneração, assistência médico-hospitalar e condições de ascensão profissional.


E tudo isso me fez lembrar de uma menina brasileira que morava no Japão e veio visitar os parentes que ficaram aqui.

A tia dela era orientadora na escola onde eu lecionava.

Certo dia estava na minha classe, tentando dar aula e explicar a matéria para os alunos que, como sempre, só conversavam e brincavam de costas para a lousa... enquanto isso, a tia, a orientadora, vagava com a garota pelos corredores da escola, procurando uma classe mais calma, onde a sobrinha pudesse ficar resolvendo as questões de uma provinha de terceira série que ela (tia) havia preparado, para verificar o aproveitamento e a adaptação da menina na escola japonesa.


Mas a menina ficou aterrorizada com a gritaria dos nossos alunos e preferiu resolver a prova na biblioteca, alegando que não conseguiria concentrar-se com aquela bagunça...


Perguntei então o que acontecia, na escola dela, com os alunos que só queriam brincar, não estudavam e não respeitavam o professor em sala de aula. Ela disse que eles eram castigados!

Perguntei então qual era o tal castigo.

E sabem o que ela respondeu?


Que não sabia, porque nunca havia visto um aluno conversar durante as explicações ou desrespeitar seu professor....

Perceberam a diferença?


Nas nossas escolas públicas, as salas de aula são superlotadas, com até 45 alunos por classe.

Para esse auditório, o professor tem que ensinar o conteúdo das disciplinas (matemática, português, história, geografia, ciências) + cidadania + valores + educação sexual + higiene + saúde + ética + pluralidade cultural.

Deverá também funcionar como psicólogo, assistente social, orientador educacional e orientador pedagógico, desempenhando também todos os deveres familiares que a sociedade resolveu transferir para a escola.


Nossos alunos dizem que as aulas são chatas e alegam que não gostam de ler porque ler não é divertido... que jogar bola e empinar pipa é melhor...


E todos logo gritam em coro:

- "Culpa dos professores que não dão uma aula divertida e atraente para as crianças!".

As autoridades da Educação alegam que o aluno que temos é assim mesmo e que os professores precisam aprender a ensinar... e rotulam o magistério oficial como “professores nota zero”.


O que eles querem esconder é que temos em classe crianças (filhos de eleitores) que recebem o livro didático, cadernos e até mochilas mas “esquecem” em casa para ficar brincando durante a aula...

Crianças que não fazem lição de casa, não estudam e nem sequer prestam atenção às explicações do professor em classe.


Para agradar aos pais eleitores, encaminham os professores para cursos de “capacitação”, alegando que eles não têm mais capacidade para ensinar.

Contratam empresas para dar esses cursos que segundo eles, tem o poder de transformar “profissionais despreparados” em professores criativos, prontos para dar uma aula eficaz, envolvente, estimulante e, ao mesmo tempo, divertida, capaz de fazer com que os alunos gostem mais da escola do que das partidas de futebol, mais de leitura do que dos jogos no computador...


É claro que esse discurso de responsabilizar o professor e varrer a sujeira pra baixo do tapete não vai levar a Educação a lugar nenhum.

Mas serve perfeitamente para justificar, junto à opinião pública, os baixos salários pagos aos profissionais educadores.


Imagine que você está doente, vai ao médico e ele prescreve determinado remédio. Você não toma o medicamento, não faz a sua parte e culpa o médico por não melhorar...

Assim acontece nas escolas públicas brasileiras: o professor ensina e os alunos não prestam atenção, não estudam, não fazem os deveres de casa, diferentemente dos nossos amiguinhos asiáticos.

Daí vem o governo e culpa o professor pelo mau desempenho dos “estudantes”.


Para justificar mais uma vez a falta de reajustes e os baixos salários alguns governos implantaram um sistema de avaliação.

Os professores recebem um bônus por produtividade:

se os alunos estudarem,

se os alunos não faltarem,

se os alunos não se evadirem,

se os alunos ...

E, como o aluno não quer saber de nada, estamos sem reajustes há mais de 10 anos!. E assim por diante!


Ninguém quer sugerir aos eleitores a receitinha das crianças asiáticas:

- fazer a lição de casa,

- estudar,

- empenhar-se,

- dedicar-se.

Enfim, fazer sua parte!


A verdade é que o educador deixou de ser modelo para os jovens: ganhamos mal, nos vestimos mal e somos alvo constante da crítica social .

Hoje, modelo para os jovens são os milionários jogadores de futebol, pagodeiros e outros mais que prefiro nem relacionar aqui...


Vamos combinar: não dá para falar em Educação de Qualidade enquanto o profissional da educação for sistematicamente desvalorizado, tratado pelo governo, pelas famílias e pela mídia em geral como um inimigo público, um vagabundo.


Nessas condições, que aluno vai querer ouvir o que uma pessoa dessas tem a dizer?"


Enviado por José Arnaldo C. Campelo em 15/11/2009.

0 comentários:

Postar um comentário